Condições de trabalho são avaliadas; presidente destaca ganhos de eficiência e mais motivação
TONI SCIARRETTA
DE SÃO PAULO
Eduardo Borloni, gerente de tecnologia do Citibank brasileiro, trocou uma hora e meia diária do trânsito caótico de São Paulo por um MBA.
Flávia Kamoi, também gerente de tecnologia do Citi, voltou a fazer ginástica e ainda consegue jantar às 19h com os três filhos pré-adolescentes.
Os dois fazem parte de equipes que tocam projetos internacionais, trabalham no desenvolvimento e na implantação de tecnologia bancária, mas estão fisicamente no conforto de suas casas.
Só o Citibank tem 301 funcionários com horário flexível e 186 que trabalham de casa, vários deles dando suporte técnico a “clientes internos” da administração e da rede de agências.
Nenhum trabalha de pijama nem sentado na cama. Antes de liberar o funcionário para trabalhar em casa, o Citi manda uma equipe para avaliar e proferir um laudo sobre as condições de trabalho na residência.
Eles tiram fotografias do local, medem ruído e conferem as condições ergonômicas de mesas e cadeiras onde o funcionário trabalhará.
Quem adere ao programa assina um aditivo ao contrato, que garante cobertura de acidente de trabalho. Além da assistência jurídica, há um acompanhamento da adaptação do funcionário.
“Não é porque estou em um projeto importante que tenho que estar no banco. Não tenho mais mesa, nem as fotos das minhas filhas. Mas voltei para a minha ginástica depois de dez anos. Posso terminar o trabalho e sair para jantar perto de casa com meus filhos. Ganhei várias horas no meu dia”, disse.
No Citi, não são todas as funções que podem ser remotas, e nem todos os funcionários conseguem se adaptar. Alguns ficam ansiosos por não ver o chefe ou ter contato com os colegas.
“Eu não estava nunca em casa; de repente, eu e minha família tivemos que nos adaptar. Em casa, temos algumas regras. Quando estou com a porta fechada é porque estou em reunião ou falando com o chefe. No horário do café, converso com as meninas. A gente tem de tomar cuidado para não misturar as coisas. Tive que aprender a lidar com isso”, disse Flávia.
Em casa, cada funcionário tem o seu ramal e um notebook específico para se conectar à rede do Citi. As despesas com o trabalho, como conexão à internet por banda larga, são pagas pelo banco.
Se a internet cai ou falta luz na residência, o que não é raro em São Paulo, eles saem correndo para as salas de contingência do banco preparadas especificamente para receber com urgência os funcionários remotos.
Segundo Gustavo Marin, presidente do Citibank no Brasil, a flexibilidade traz motivação, produtividade e criatividade dos funcionários. O banco também ganha eficiência aproveitando melhor seu espaço físico.
“Com o blackberry estamos todos conectados e trabalhando muito mais. Se vai entrar mais tarde ou sair mais cedo, o importante é o resultado”, disse Marin.
Governo federal também testa o trabalho em casa
Órgãos federais experimentam teletrabalho, mas controle de produtividade ainda é raro
ANDREZA MATAIS
DIMMI AMORA
DE BRASÍLIA
Mesmo sem previsão legal, setores do governo federal começam a liberar funcionários para trabalhar em casa. Pelo menos cinco órgãos da União já têm ou estudam adotar o teletrabalho.
O primeiro órgão federal a adotar o modelo foi o Serpro, empresa de informática vinculada ao Ministério da Fazenda. A iniciativa surgiu com um projeto piloto em 2006. No ano passado, o TCU (Tribunal de Contas da União) também aderiu.
Este ano foi a Receita Federal, também com um piloto. Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal se preparam para aderir.
A comunicação entre o servidor e a chefia é feita por internet e telefone. No TCU, os servidores públicos são informados que devem “consultar diariamente o e-mail”.
O controle do funcionário passa a ser feito não pelas horas trabalhadas, no modelo de cartão de ponto, mas por sua produtividade. A legislação prevê, porém, 40 horas semanais de trabalho.
Para o ex-presidente do TCU (Tribunal de Contas da União) Ubiratan Aguiar, responsável pela adoção do sistema, o trabalho em casa é justificável. “Mulher com filho pequeno é a que mais adere. Ela pode ficar em casa produzindo”, diz.
Os servidores são autorizados a levar documentos sigilosos para analisar em casa. O tribunal não libera mais que 30% do seu quadro para o teletrabalho para manter “o senso de equipe”.
Segundo Álvaro Mello, fundador da Sociedade Brasileira de Teletrabalho, a produtividade desse tipo de trabalhador aumenta em média 30% porque ele deixa de conviver num ambiente onde há várias interrupções.
“Na hora do almoço, eu vou jogar futebol e, no fim da tarde, leio livros. O trabalho rende mais em casa porque não tenho interferência, conversas paralelas”, conta Flávio Correia de Souza, 43 anos, há cinco anos trabalhando em casa pelo Serpro.
Mas há dificuldades para se implementar o teletrabalho no setor público. Segundo Mello, os órgãos precisam ter um controle de produtividade, o que poucos têm, evitando assim que a pessoa se aproveite do programa para não trabalhar.
Regulamentação prevê horário flexível, mas sem hora extra
DE BRASÍLIA
A Câmara aprovou no início do mês projeto de lei que regulamenta o teletrabalho. O texto define esse profissional como quem trabalha de forma regular ou 40% do tempo fora da repartição.
O trabalhador que opta por ficar em casa não terá direito a hora extra, mas pode pedir falta por motivo de saúde, além de ressarcimento de gastos extraordinários.
O teletrabalhador fica obrigado a prestar informação periódica à empresa, seja de forma on line ou off line, sendo permitido o trabalho nos finais de semana, “uma vez que se trata de jornada de trabalho aberta”.
Autor do projeto, o deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES) disse que o objetivo da proposta é flexibilizar o conceito de local de trabalho e proteger o empregador de ações judiciais.
26/12/2010
Citi deixa funcionário trabalhar em casa
Para driblar perda de produtividade com trânsito, banco mantém 186 funcionários em casa e 301 com horário flexível