Nas reuniões no final do expediente, José é chamado de incompetente na frente dos colegas, humilhado por seu superior na presença de clientes.
Em outra agência bancária não muito longe, está Sueli. Ela sofre de LER (Lesão por Esforços Repetitivos – conseqüência de seu trabalho como bancária). A doença é tão grave que ela não consegue segurar seu filho no colo. Sueli sai de licença e, após passar pela perícia do INSS, tem que entregar o documento na sua agência. Ela está tranqüila, afinal, sabe que seu afastamento é conseqüência de algo grave e que o banco vai entender seu caso. Chegando lá, o quadro é outro.
Logo que a gerente toma conhecimento de sua situação, fala em alto e bom som para todos escutarem: “E agora, o que você vai fazer? Vai para o shopping passear?” É nítido seu constrangimento e também dos colegas. Sueli não sabe se responde ou fica calada. Opta pela segunda opção. “Tudo bem, é só uma brincadeira” pensa ela.
Porém , o caso se repete. Durante seu afastamento, cada ida a agência é uma tortura. Sueli sempre é surpreendida com ironias e brincadeiras de mal gosto por parte da chefia. Sueli se sente humilhada e perde a vontade de ir à agência. E a o tratamento havia apenas começado…
Os nomes dos personagens são fictícios, mas os fatos não. Segundo a revista “Consultor Jurídico” de julho de 2005, estima-se que no Brasil pelo menos 40% dos trabalhadores sofreram o mesmo tipo de violência moral que Sueli e José. Esse abuso já possui nome: Assédio Moral. Também chamado psicoterror e coação moral, ele é tão antigo quanto o trabalho.
Definição
Qualquer atitude vexatória ou constrangedora, sendo Assédio Moral ou não, tem que ser combatida. Porém, nem todos os casos de humilhações no local de trabalho podem ser caracterizados como Assedio Moral.
Segundo o site “Assédio moral no trabalho: chega de humilhação!” a atitude é caracterizada por “exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”.
O Assédio Moral é caracterizado pelo isolamento de um elemento do grupo que passa a ser constantemente humilhado e ridicularizado. Assim como Sueli e José, a vítima tem sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais comprometidas.
Sintomas
Entre os sintomas mais comuns do psicoterror estão: alterações do sono, distúrbios alimentares, diminuição da libido, aumento da pressão arterial, desânimo e insegurança, podendo acarretar quadros de pânico e de depressão. Em casos extremos, pode levar à morte ou ao suicídio. O diretor de Saúde do Sindicato, Gustavo Moreno, afirma que é unânime nos fóruns de discussão sobre o assunto, que o maior causador do Assédio Moral nos Bancos é o plano de metas. Ele explica que a exigência de obtenção de lucro acaba aumentando e tornando sistemática a pressão sobre a categoria.
Legislação
O primeiro país a instituir pena por assédio moral foi a França em 2001. No mesmo ano, Iracemápolis (SP) tornou-se a primeira cidade brasileira a regulamentar uma lei sobre o assunto.
Em Campinas a lei no 11.409 de novembro de 2002, prevê punição em caso de assédio moral. Ela presume suspensão e demissão em casos de reincidências. “O problema é que as leis municipais referem-se exclusivamente aos funcionários públicos” conta Gustavo. Dessa forma, bancários de bancos privados ficam sem a proteção de uma lei. Porém, eles não estão totalmente desprotegidos: os sindicatos possuem outras armas legais para combater o Assédio Moral na esfera privada.
O projeto de Assédio Moral da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), por exemplo, traz uma proposta de Projeto de Lei a ser enviada ao Congresso Nacional sobre o assunto que englobe o setor privado. Além disso, a CNB também está apresentando proposta junto a Fenaban (Federação Nacional dos Bancos) para que seja criada uma cláusula sobre Assédio Moral na Convenção Coletiva dos Bancários.
O quê fazer?
Em casos como o de José e Sueli, o diretor Gustavo informa que a solução é o bancário assediado denunciar o caso ao Sindicato. Se possível, a vítima deve colher alguma prova, seja uma conversa gravada ou depoimento de testemunha.
O trabalho do Sindicato começa a partir da denúncia. “É importante que todos denunciem para conhecermos os casos e agirmos em defesa da categoria” salienta o diretor de saúde Gustavo. Após as denúncias serem averiguadas, o Sindicato define estratégias para agir sobre o caso de Assédio Moral e, se for necessário, auxilia a vítima a tomar as medidas judiciais cabíveis.
O diretor de Saúde conta que a responsabilidade pelo Assédio Moral não é apenas do agressor, mas também do banco que implementa metas absurdas de serem cumpridas pelos funcionários. “É uma pressão que vem de cima, dos altos escalões dos bancos e recaem sobre a gerência e, conseqüentemente, sobre seus subordinados” explica Gustavo. Além disso, o banco alimenta o individualismo exacerbado, o que contribuiu para intensificar os casos de Assédio Moral.
Segundo dados do Sindicato (até setembro de 2005), o grupo financeiro que mais possui reclamações de Assédio Moral em Campinas e região é o Bradesco. Em conseqüência disso, o Sindicato já se reuniu com o representante do R.H. do banco solicitando que sejam tomadas providências urgentes na solução das constates humilhações sofridas pelos seus funcionários.
Se você é vítima de assédio moral, não deixe de denunciar ao Sindicato – envie um email contando seu caso que tomaremos as medidas necessárias (clique aqui).
Contraf-CUTA Contraf-CUT, em parceria com o Fundo Pela Igualdade de Gênero (FIG) – instituição canadense- e o Sindicato dos Bancários de Pernambuco, desenvolveram o projeto: “Assédio moral na categoria bancária: uma experiência no Brasil”.
Uma de suas etapas consiste na elaboração da cartilha “Assédio moral é ilegal e imoral. Você não pode ser cúmplice. Denuncie”. Além disso, os bancários de várias partes do país responderam a uma pesquisa via internet.
Conforme divulgado na 7ª Conferência Nacional dos Trabalhadores do Ramos Financeiro, em 31 de julho de 2005, essa pesquisa consiste na aplicação de um questionário que busca investigar a freqüência e gravidade do assédio moral nos bancários. A comissão criadora do projeto pretende atingir aproximadamente 10% dos bancários brasileiros, o que equivale a 4 mil pessoas.